Osvladir Custódio - Psiquiatria

Quais os sintomas de demência frontotemporal?

Osvladir Custódio • 2 de novembro de 2021

demência frontotemporal, desinibição comportamental, demência, senilidade, transtorno cognitivo maior, afasia, caduquice, caducidade, alienação, decrepitude, decadência , maluquice, doença de Pick, afasia progressiva primária



Demência é um termo genérico. É o declínio, geralmente progressivo, dos domínios cognitivos, como, por exemplo, memória, linguagem e atenção/concentração, que causa prejuízo das atividades normais e dos relacionamentos de uma pessoa.

Nosso cérebro é formado por cinco lobos: frontal, temporal, parietal, temporal e occipital. Demência frontotemporal refere-se a um grupo de distúrbios, incluída a doença de Pick, causados ​​pela perda progressiva de células nervosas nos lobos frontais e/ou nos lobos temporais, que pode levar perturbações do comportamento, personalidade e/ou dificuldade em produzir ou compreender a linguagem.


 “No último ano, nós observamos mudanças na personalidade de Brenda. Quando éramos jovens, o meu lado do nosso quarto era sempre bagunçado, e  o dela limpo e organizado. Há um ano, meu pai foi à casa dela para trabalhar em algo e me disse que ela tinha  "pilhas de coisas". Quando minha mãe soube, ofereceu-se para ajudar minha irmã na tarefa de limpar a casa. Brenda ficou bastante irritada.”  

(Karen Boothe, My walk with my sister: on the journey of frontotemporal degeneration).


Acomete pessoas mais jovens ainda em atividade. É normal que os parentes e pessoas próximas notem as mudanças no comportamento assim que elas começam a aparecer. No entanto, sem o conhecimento da doença, muitos pacientes podem ser levados para psiquiatras, quando acreditam que se trata de um problema mental. Muitas vezes, alternam-se diagnósticos, às vezes, levando anos para o diagnóstico correto.

 


Demência frontotemporal é comum?


Se no mundo há 50 milhões de pessoas com demência (2018), 2,5-5,0 milhões (5-10%) têm demência frontotemporal. Essa demência pode ser ainda chamada de doença de Pick ou degeneração frontotemporal.

Em geral, acomete pessoas mais mulheres e acima de 50 anos.  O início desse tipo demência, em particular, é insidioso e a evolução progressiva. O tempo de sobrevida, com base em metanálises, é altamente variável em todo o espectro de demência frontotemporal. O curso mais agressivo está associado demência frontotemporal associada à doença do neurônio motor, levando à morte normalmente dentro de três a cinco anos do início dos sintomas, enquanto uma proporção substancial de pacientes (particularmente aqueles com demência semântica) sobrevivem por bem mais de uma década. Comportamentos erráticos e intrusivos, apatia, incontinência, mutismo e disfagia são problemas comuns no final da vida e fontes importantes de angústia do cuidador. A carga colocada sobre aqueles que cuidam desses pacientes é grande, mesmo em comparação com outras doenças neurodegenerativas.


Quais os sintomas de demência frontotemporal?


Dentro do que chamamos demência frontotemporal, com base em seus sintomas, podemos ter variantes clínicas: demência frontotemporal variante comportamental e as afasias progressivas primárias em que a linguagem é comprometida. Contudo, na prática, há grande sobreposição entre essas variantes clínicas.

A demência frontotemporal variante comportamental é, sobretudo, caracterizada inicialmente por mudanças importantes na personalidade e no comportamento com relativa preservação das funções cognitivas. As pessoas acometidas frequentemente não têm autopercepção ou insight da sua doença, ou seja, da própria demência, o que chamamos de anosognosia.


 “Expliquei que não era certo acumular coisas, não limpar a casa, a raiva que demonstrava e não cuidar de si mesma. Surpreendentemente, não ficou brava e repetiu algumas vezes "eu sei". Antes que terminasse de falar, ela pulou e disse: "Conversei com a Nicky ontem e ela colocou fotos dos sutiãs que reunimos em seu site!" Ela se conectou ao computador e começou a procurar as fotos.”

(Karen Boothe, My walk with my sister: on the journey of frontotemporal degeneration)


O primeiro sinal, geralmente, pode ser um episódio de depressão. Em seguida de perturbações comportamentais desinibição, negligência com os cuidados pessoais e de higiene, hiperoralidade e desatenção. As reações de alegria ou tristeza passam a ser notadamente desproporcionais ao estímulo.


 “Ela parou de cortar o cabelo e as unhas dos pés e não limpava mais o carro.”

(Karen Boothe, My walk with my sister: on the journey of frontotemporal degeneration)


Pacientes podem manifestar apatia, perda da motivação, passividade e tendência ao isolamento social. As alterações comportamentais podem ser observadas com mudança de hábitos norteados por padrões morais diferentes: mudança de religião, surgimento de tabagismo ou alcoolismo tardios.

Desinibição comportamental é marcada por comportamentos em desacordo com as regras sociais sobre o que dizer, onde dizer ou fazer. O sujeito pode não ficar constrangido ou sentir-se próximo de estranhos já no primeiro contato. Pode, p. ex., fazer comentários indelicados sobre a aparência física de outra pessoa, seduzir inapropriadamente alguém, fazer comentários de natureza sexual e embaraçar ou assediar outra pessoa. Pode despir-se ou masturbar-se em situações ou ambientes impróprios. O comportamento desinibido pode provocar constrangimento, irritação ou perplexidade em familiares e cuidadores.

Impulsividade é uma tendência a agir sobre com pouca ou nenhuma premeditação, reflexão ou consideração das consequências. A pessoa pode fazer gastos impróprios, ficar vulnerável a golpes financeiros e maltratar pessoas com xingamentos. Depravação sexual é o aparecimento de comportamento sexual inadequado. Pode ocorrer até abusos sexuais.

Pode apresentar obsessão ou apego a hábitos sem sentido, como só comer em dada hora e da mesma forma.

Tem dificuldade de julgar as emoções dos outros. Torna-se incapaz de notar o tom de uma conversa, e ajustar-se de acordo com a situação pede.

A síndrome de Diógenes é muito comum na demência frontotemporal e caracteriza-se por extrema autonegligência, descuido do lar, isolamento social, apatia e acúmulo compulsivo de lixo ou animais. Frequentemente, no noticiário diário ou nos programas de televisão, aparecem casos de idosos acumuladores de animais, causando grande comoção pela inadequação do ambiente e dos cuidados.


”O médico perguntou quais eram minhas preocupações, e eu retirei minha lista. A lista: a acumulação, a casa imunda, a falta de higiene pessoal, o controle da bexiga, a raiva inexplicável, a perturbação de atenção, a falta de concentração no trabalho  e a mudança de hábitos alimentares.” (Karen Boothe, My walk with my sister: on the journey of frontotemporal degeneration)


Perturbações motoras podem ocorrer no curso da demência frontotemporal. A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é uma delas e afeta o sistema nervoso de forma degenerativa e progressiva, levando à paralisia motora irreversível. Mais recentemente, as campanhas como o “Desafio do balde do gelo” e a disponibilidade, em serviços de streaming, do filme “A Teoria de Tudo” ajudaram na conscientização da existência da ELA. Esse filme descreve o relacionamento do físico Stephen Hawking, portador da ELA desde os 21 anos, e sua primeira esposa.

A síndrome corticobasal e paralisia supranuclear progressiva são outras doenças neurológicas degenerativas que ocorrem no curso dessa demência.

A questão principal é a dificuldade cognitiva é a realização ou execução de tarefas, chamadas de disfunção executiva. Ficam desatentos. P. ex., são descuidados, quando dirige um carro, na observação de sinais de trânsito e podem avançar sinais vermelhos. Podem exibir dificuldade aumentada no uso e compreensão da linguagem escrita e falada como, p. ex., dificuldade em encontrar a palavra certa para o discurso ou a nomeação de um objeto. Quando tem dificuldade de nomear itens, substitui a palavra específica por uma palavra mais geral como, p. ex., “isso” para expressar caneta. 

O paciente pode apresentar o discurso hesitante que pode parecer telegráfico, não sabem o significado de palavras e cometem e erros na construção da frase. Com a evolução da doença, pode deixar de falar definitivamente.


Diferenças chaves entre demência frontotemporal e doença de Alzheimer


A doença de Alzheimer é mais prevalente do que a demência frontotemporal. Alguns elementos ajudam diferenciar essas demências:

  1. A demência frontotemporal acomete pessoas mais jovens entre 40 e 60 anos. A prevalência da demência de Alzheimer, por outro lado, aumenta com a idade.
  2. A perda de memória costuma ser um sintoma mais proeminente no início da doença de Alzheimer. Nos casos de demência frontotemporal, é um sintoma que aparece em estágio mais avançado.
  3. As mudanças de comportamento e da personalidade são os sintomas mais visíveis no início da variante frontal ou comportamental. Conforme a doença de Alzheimer progride, alterações de comportamento e da personalidade também ocorrem, só que mais tardiamente.
  4. As pessoas com doença de Alzheimer podem ter dificuldade em encontrar a palavra certa ou em se lembrar de nomes. Nas pessoas com demência frontotemporal, tem muita dificuldade em falar com sentido, entender a fala de outras pessoas ou ler.
  5. Problemas com orientação espacial - por exemplo, se perder em lugares familiares - são mais comuns na doença de Alzheimer do que na demência frontotemporal.
  6. Alucinações e delírios são relativamente comuns com a progressão da doença de Alzheimer . São incomuns na demência frontotemporal.


Como é o diagnóstico?


O diagnóstico de demência frontotemporal variante comportamental e de afasia primária progressiva é baseado na avaliação feita por um médico familiarizado com esses distúrbios.

O tipo de problemas vivenciados pelo paciente e os resultados dos exames neurológicos e neuropsicológicos são o cerne do diagnóstico. Exames cerebrais como ressonância magnética (MRI) e o PET neurológico são testes adicionais muito úteis, mas devem ser interpretados no contexto da história e do exame neurológico do paciente.

Cerca de 10-15% dos pacientes diagnosticados com demência frontotemporal têm uma história familiar positiva para esta demência com um padrão de herança autossômico dominante

Qual o tratamento?


Não há tratamento específico para demência frontotemporal

Existem também terapias não farmacológicas para alguns sintomas dessa demência. Psicoeducação dos familiares pode ajudar a minimizar ou redirecionar comportamentos indesejados. Exercício físico pode retardar o declínio cognitivo e deve ser recomendado. Os déficits de linguagem, em afasia progressiva primária, podem se beneficiar da terapia da fala.

Existem medicamentos que podem reduzir a agitação, irritabilidade e / ou depressão. Esses tratamentos devem ser usados ​​para ajudar a melhorar a qualidade de vida.

Aceita-se que os sintomas e o comportamento da dessa demência podem melhorar com inibidores seletivos da captação de serotonina e, em um pequeno estudo, trazodona.

Antipsicóticos atípicos devem ser usados ​​com cautela, uma vez que os pacientes podem ter aumento da vulnerabilidade aos efeitos colaterais extrapiramidais e a recomendação de evitar em casos de agitação em demenciados por conta do risco de acidentes vasculares cerebrais e morte.

 


Por Osvladir Custódio 28 de dezembro de 2021
Neste texto, tratamos do tratamento e suas barreiras no transtorno obsessivo compulsivo.
Por Osvladir Custódio 26 de dezembro de 2021
Trata do papel do treinamento resistido no humor. Discorre um pouco da história do levantamento de pesos.
Por Osvladir Custódio 25 de dezembro de 2021
Prevalência e tratamento do tabagismo. Fumar melhora a saúde mental?
Share by: